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La lógica argumentativa y proposicional en el proceso de construcción de argumentos científico-filosóficos

LA lógica argumentativa e proposicional no processo de construção de argumentos científico-filosóficos

The argumentative and propositional logic in the construction of scientific and philosophical arguments process

Jeane Torres da Silva [1]
Faculdade Salesiana Dom Bosco / FSDB Manaus , Brasil

La lógica argumentativa y proposicional en el proceso de construcción de argumentos científico-filosóficos

Sophia, Colección de Filosofía de la Educación, vol. 2, núm. 21, 2016

Universidad Politécnica Salesiana

Recepción: 05 Julio 2016

Aprobación: 15 Agosto 2016

Resumen: En este artículo se presenta un análisis epistemológico de las contribuciones de la lógica argumentativa y la lógica proposicional, basado en estructuras proposicionales que componen los argumentos lógicos, como modelos para la construcción de argumentos en los textos científicos y filosóficos. El objetivo de la investigación fue identificar las perspectivas comunes teóricos de la lógica argumentativa y la lógica proposicional, que contribuyen a los procesos cognitivos de razonamiento lógico y su transposición al lenguaje lógico, que muestran cómo utilizar la estructura proposicional y argumentativa en la construcción de textos científicos y filosóficos, para comunicar sus ideas con coherencia, claridad, objetividad y la cohesión. Las razones para el estudio se derivan de la práctica de las obras de terminación de la orientación de los cursos de graduación, en los que era posible percibir las dificultades de los estudiantes de educación superior para construir textos con coherencia lógica necesaria y suficiente para la comprensión del lector. La base teórica de la investigación fue reflejada por los conceptos, las ideas y las teorías de filósofos, matemáticos e investigadores dedicados al estudio de la lógica, especialmente Aristóteles (2010), Kant (1992), Frege (2009), Copi (1981) y Weston ( 1996). El enfoque metodológico se guio por las reglas de la investigación cualitativa, lo que permite la interpretación de los procesos lógicos que pueden contribuir a la construcción de argumentos en el texto enfoque científico-filosófica de la investigación se basó en el método deductivo, con la composición de argumentos lógicos e informales el uso de los procedimientos de observación y la literatura. Los resultados indicaron que la estructura proposicional de los argumentos deductivos se puede utilizar para construir argumentos lógicos informales, siendo útil para sintetizar la información y comunicar ideas y teorías, textos científicos y filosóficos con niveles de mayor comprensión para el lector.

Palabras clave: Razonamiento lógico, argumento lógico, estructura proposicional, texto científico y filosófico, pruebas sentido lógico.

Resumo: Este artigo apresenta uma análise epistemológica das contribuições da lógica argumentativa e da lógica proposicional, baseada nas estruturas proposicionais que compõem os argumentos lógicos, como modelos para a construção de argumentos em textos científico-filosóficos. O objetivo da pesquisa foi identificar as perspectivas teóricas comuns da lógica argumentativa e da lógica proposicional, que contribuem com o processo cognitivo do raciocínio lógico e sua transposição em linguagem lógica, visando demonstrar como utilizar a estrutura proposicional e argumentativa na construção de textos científico-filosóficos, para que comuniquem suas ideias com coerência, clareza, objetividade e coesão. As razões que motivaram a pesquisa foram decorrentes da pratica de orientação de trabalhos de conclusão de cursos da graduação, onde foi possível perceber as dificuldades dos estudantes do ensino superior para construir textos com coerência lógica necessária e suficiente para a compreensão do leitor. A fundamentação teórica da pesquisa foi refletida a partir de concepções, ideias e teorias de filósofos, matemáticos e pesquisadores dedicados ao estudo da lógica, principalmente Aristóteles (2010), Kant (1992), Frege (2009), Copi (1981) e Weston (1996). O percurso metodológico foi norteado pelos ditames da pesquisa qualitativa, possibilitando a interpretação dos processos lógicos que podem contribuir com a construção de argumentos em texto científico-filosóficos, a abordagem da pesquisa foi baseada no método dedutivo, com a composição de argumentos lógicos informais, bem como a utilização dos procedimentos da observação e da pesquisa bibliográfica. Os resultados indicaram que a estrutura proposicional dos argumentos dedutivos pode ser utilizada na construção de argumentos lógicos informais, sendo bastante útil para sintetizar informações e comunicar ideias e teorias, em textos científico-filosóficos com níveis de compreensibilidade maior para o leitor. Forma sugerida de citar: Torres da Silva, Jeane (2016). La lógica argumentativa y proposicional en el proceso de construcción de argumentos científico-filosóficos. Sophia, colección de Filosofía de la Educación, 21(2), pp. 57-81.

Palavras-chave: Raciocínio lógico, argumento lógico, estrutura proposicional, texto científico-filosófico, sentido lógico textual.

Abstract: The article presents an epistemological analysis of the contributions of argumentative logic and propositional logic, based on propositional structures that make up the logical arguments, as models for the construction of arguments in scientific and philosophical texts. The aim of the research was to identify the common theoretical perspectives of argumentative logic and propositional logic, which contribute to the cognitive process of logical reasoning and its transposition into logical language, which demonstrate how to use the propositional and argumentative structure in the construction of scientific and philosophical texts, to communicate their ideas with consistency, clarity, objectivity and cohesion. The reasons for the study was derived from the practice of orientation completion works of the undergraduate courses, where it was possible to perceive the difficulties of higher education students to build texts with necessary and sufficient logical consistency to the reader’s understanding. The theoretical basis of the research was based on concepts, ideas and theories of philosophers, mathematicians and researchers dedicated to the study of logic, especially Aristotle (2010), Kant (1992), Frege (2009), Copi (1981) and Weston (1996). The methodological approach was ushered by the proceedings of qualitative research, enabling the interpretation of the logical processes that can contribute to the construction of arguments in text scientific-philosophical approach the research was based on the deductive method, with the composition of logical reports arguments and the use of the procedures of observation and literature. The results indicated that the propositional structure of deductive arguments can be used to build logical arguments reports, and useful to synthesize information and communicate ideas and theories, scientific and philosophical texts with levels of greater comprehensibility for the reader.

Keywords: Logical reasoning, logical argument, propositional structure, scientific and philosophical text, textual logical sense.

Forma sugerida de citar:

Torres da Silva, Jeane (2016). La lógica argumentativa y proposicional en el proceso de construcción de argumentos científico-filosóficos. Sophia, colección de Filosofía de la Educación, 21(2), pp. 57-81.

Introdução

O tema desta pesquisa se insere no âmbito das competências necessárias para processar um raciocínio lógico e dos procedimentos para construir argumentos lógicos corretos e coerentes em textos científico-filosóficos, que modo a torná-lo compreensível aos leitores, conforme orientam as práticas metodológicas de pesquisa. Para realizar uma pesquisa é preciso conhecer e aplicar os procedimentos metodológicos, saber planejar através de projetos, executar as etapas de investigação e apresentar os resultados da pesquisa por meio de artigo, ensaio, resenha, dossiê, relatório, relato de experiência, nota científica, monografia, dissertação, tese e outras. Mas para realizar uma pesquisa, desde o planejamento até a apresentação dos resultados, é necessário ter algumas competências e habilidades cognitivas fundamentais para a execução desse processo, como a capacidade de raciocínio lógico, abstrato, reflexivo e relacional. Os pesquisadores não fazem pesquisa para si, mas para outrem conhecer, utilizar e promover conjuntamente o avanço do conhecimento no sentido de resolver problemas da vida, da sociedade e do mundo.

O objetivo desta pesquisa é estabelecer uma interação entre a lógica argumentativa e a lógica proposicional, identificando perspectivas epistemologias comum ao processo cognitivo do raciocínio lógico e sua transposição em linguagem lógica informal, demonstrando como construir argumentos coerentes e apropriados à produção de textos científico-filosóficos, para que comuniquem suas ideias com coerência, clareza, objetividade e coesão. Para alcançar esses objetivos é necessário exercitar habilidades cognitivas da abstração e relação conceitual, ordenamento lógico de ideias e reflexão-crítica de conceitos universais.

A problemática desta pesquisa emergiu das experiências de orientação de trabalhos de conclusão de curso na graduação. O trabalho de pesquisa não necessita apenas de orientação metodológica, também necessita de ordenamento lógico de ideias, linguagem acessível e compreensível ao leitor, e considerando que os pesquisadores passaram por um longo período escolar de estudo da linguagem –língua e gramática–, é aceitável que seja exigido dos pesquisadores o domínio de uma linguagem correta, objetiva e compreensiva; mas quanto à lógica, em que área de conhecimento o pesquisador estuda sobre o desempenho do raciocínio lógico e como demonstrar esse raciocínio na forma de argumentos corretos e coerentes que possam ser compreendidos facilmente por um leitor? Para responder esta problemática, foi realizada uma análise de conceitos lógicos e matemáticos, refletidos com as necessidades de acadêmicos para produzir textos científico-filosóficos.

Esta temática é importante para refletir uma necessidade prática da pesquisa, que é o ordenamento lógico das ideias e sua transposição em linguagem argumentativa correta, coerente e objetiva, que possibilite os leitores a realizar uma hermenêutica de compreensão das informações comunicadas na pesquisa. Essas dificuldades dos acadêmicos-pesquisadores são perceptíveis durante o acompanhamento e orientação de pesquisa. Vale resaltar que o ordenamento das ideias –clareza, objetividade e coerência– em um texto científico-filosófico, não dependem somente do domínio da gramática ou normas para produção textual, também é necessário exercitar competências e habilidades cognitivas para raciocinar de modo lógico, abstrato e reflexivo, bem como conhecer e saber relacionar signos linguísticos, conceitos, proposições e argumentos. A superação dessas dificuldades pode contribuir para melhorar a qualidade das informações comunicadas em textos científico-filosóficos.

No contexto atual, produzir textos científico-filosóficos, com argumentos lógicos corretos e coerentes à compreensão, parece ser um desafio para muitos acadêmicos-pesquisadores. Ao observar as práticas acadêmicas de pesquisa, é possível perceber que os estudantes conhecem as normas da ABNT 1 , aprendem a planejar, aplicar procedimentos e executar suas pesquisas, mas quando chega o momento de refletir, relacionar e associar os conceitos pesquisados com a realidade investigada, ou até mesmo relacionar distintas concepções para deduzir outras, nesse momento surge às dificuldades dos estudantes, parece um martírio ter que raciocinar e deduzir suas próprias ideias, provavelmente à fase mais difícil seja transcrever suas ideias abstratas na forma de argumentos lógicos, que demonstrem coerência, correção, objetividade, coesão e clareza. A intenção desta pesquisa é indicar possíveis soluções para o enfrentamento desses desafios.

A metodologia utilizada para realizar esta pesquisa foi a abordagem qualitativa, com análise de informações baseadas no método de procedimento da observação e da pesquisa bibliográfica, cujas informações analisadas foram observadas a partir da experiência em orientação de trabalhos de conclusão de curso (TCC) na graduação, bem como a experiência docente no ensino de lógica. Também se realizou o levantamento do material bibliográfico oriundo de filósofos e matemáticos, como Aristóteles, Kant, Whitehead, Copi, Wittgenstein e Severino.

Destarte, a apresentação das informações desta pesquisa, foi organizada em suas partes: A epistemologia da lógica argumentativa e proposicional; e A estrutura lógica argumentativa e proposicional na construção de textos científico-filosóficos. Na primeira parte foram apresentados, analisados e sintetizados os fundamentos epistemológicos da lógica argumentativa e proposicional, destacando sua origem, princípios matemáticos da lógica, elaboração de raciocínio lógico e sua comunicação por meio da linguagem. Na segunda parte foi apresentada a estrutura de composição das proposições simples, compostas e complexas, inerentes ao argumento dedutivo, como propostas modelares, referenciais e estruturais para construir argumentos lógicos informais em textos científico-filosóficos

A epistemologia da lógica argumentativa e proposicional

Ao longo do desenvolvimento do estudo da lógica surgiram várias definições, tais como: a lógica é a “ciência das leis necessárias do entendimento e da razão em geral” (KANT, 1992, p.30); a lógica é “o estudo dos métodos e princípios usados para distinguir o raciocínio correto do incorreto” (Copi, 1981, p. 19); a “lógica estuda a razão como instrumento da ciência ou meio de adquirir a verdade” (Maritain, 2001, p.17). Partindo dessas definições pode-se afirmar que à lógica consiste no estudo de princípios cognitivos do pensamento e entendimento humano, que podem ser demonstrados através de linguagem com o intuito de elaborar, identificar e distinguir um argumento correto.

As bases epistemológicas da lógica argumentativa são oriundas da filosofia clássica, sistematizada pelo filósofo Aristóteles (2010), que considerava a lógica uma “ferramenta” de trabalho do processo investigativo para aquisição de conhecimentos, tanto no campo filosófico quanto científico. O estudo da lógica aristotélica perpassou toda a Idade Média e início da Modernidade sem muitas inovações. Durante esse período, a lógica clássica foi apenas aperfeiçoada e sistematizada sua aplicação como instrumento de acessibilidade ao conhecimento. Foi somente no final da Idade Moderna que a lógica foi relacionada à matemática, e no início da contemporaneidade surgiram novas teorias significativas no campo da lógica. A relação lógica-matemática deu origem a diversos campos da lógica, como a lógica simbólica, lógica matemática e programação lógica.

Para compreender os fundamentos da lógica argumentativa e proposicional serão destacados dois campos de estudo da lógica: os estudos da lógica clássica aristotélica, que se popularizou como lógica de argumentação ou lógica argumentativa; e os estudos da lógica simbólica, que comumente é dividida em lógica proposicional e lógica predicativa.

A lógica simbólica surgiu no século XIX, seu principal teórico é o matemático Gottlob Frege, que em sua obra Lógica e Filosofia da Linguagem (2009) expõe sua Teoria de Conceitografia (Begriffsschrift), que posteriormente ficou conhecida como Linguagem Simbólica ou Lógica Simbólica. Frege (2009) considera a conceitografia não como lógica, mas sim uma linguagem para demonstrar conceitos e enunciados aritméticos, cujo conteúdo lógico das proposições poderia ser julgado e provado matematicamente. Com o tempo sua teoria sofreu várias críticas e impossibilidades de aplicação em algumas áreas de conhecimento. Atualmente a Lógica Simbólica é bastante utilizada pelas Ciências da Computação principalmente em Programação Lógica.

Como foi afirmado acima, a lógica simbólica se dividida em lógica proposicional e lógica predicativa, no entanto, será destacado e estudo apenas a perspectiva da lógica proposicional, que se originou na escola filosófica Estoicismo 2 . De acordo com os Estoicos, a proposição é “aquilo que se afirma; o enunciado utilizado em uma inferência lógica” (Branquinho; Murcho; Gomes, 2006, p. 628), diferente das proposições simples ou categóricas de Aristóteles, os Estoicos reconheciam o valor-verdade de proposições compostas e hipotéticas, o que serviu de base para a construção da lógica proposicional ou lógica de enunciados, criada no século XIX.

A sistematização da lógica proposicional contou com a contribuição de matemáticos e filósofos, principalmente Frege, Bertrand Russell e Ludwing Wittgenstein, o qual organizou as proposições compostas e hipotéticas em tabelas verdades com o propósito de calcular o valor-verdade dessas proposições. A lógica proposicional ou de enunciados, “trata-se de uma conexão de verdade que é enunciada na linguagem cotidiana por meio de conjunções como ‘e’, ‘se...então...’” (Buchholz, 2009, p. 155). A intenção não é demonstrar a construção e o cálculo proposicional das tabelas-verdade, mas apenas demonstrar como as proposições simples e as proposições compostas podem servir de modelos para a construção de proposições e argumentos científico-filosóficos.

Tanto a lógica argumentativa quanto a lógica proposicional apresentam em sua origem fundamentos matemáticos. Aristóteles (2010, p. 286) reconhece dois tipos essenciais de argumentos lógicos: a dedução e a indução; firma que o argumento dedutivo é um método demonstrativo que procede dos universais, enquanto o argumento indutivo é decorrente da percepção sensorial que procede dos particulares. Essas duas perspectivas da lógica clássica sustentam a base de origem dos métodos de abordagem de pesquisa: dedução e indução. Mas são os argumentos dedutivos que predominam nos estudos da lógica argumentativa, pois são de natureza universal, baseados em princípios matemáticos, como abstração, relação e demonstração.

Desde sua origem, a lógica da argumentação se preocupava com a elaboração abstrata do raciocínio e sua posterior configuração em forma de argumentos. Não havia uma contundente relação entre lógica e matemática, mas já se fazia presente alguns princípios que nortearam essa proximidade, como os princípios lógicos do raciocínio que estabelecem os valores de verdade ou falsidade sobre as afirmações ou negações. Copi (1981, p. 256) sintetiza esses princípios afirmando que:

Princípio de Identidade: P = P. Se qualquer proposição for verdadeira, então será verdadeiro, jamais negar uma ocorrência, pois em lógica não é possível criar situações inexistentes para justificar uma hipótese.

Princípio da não-contradição: ~(P e ~P). Nenhuma proposição pode ser verdadeira e falsa simultaneamente, em lógica não deve haver contradições ou hipóteses contraditórias.

Princípio do Terceiro Excluído: P ou ~P. Uma proposição ou é verdadeira ou é falsa, em lógica não pode haver ambiguidades, por vezes é necessário excluir uma hipótese para poder validar outra.

A natureza matemática das proposições foi gradativamente sendo reconhecida ao longo do processo de compreensão e aplicação das proposições na construção de argumentos. Desde a modernidade até a contemporaneidade, teóricos da filosofia, matemática e linguagem, contribuíram para compreender e ampliar os horizontes do estudo da lógica, como Descartes, Leibniz, Russell, Whitehead, Wittgenstein, Venn, Boole, Peano, Frege e outros. O estudo da lógica envolve matemática e linguagem, por isso seu alcance epistemológico é complexo, e não se restringe apenas a estudos teóricos, a lógica tem finalidade prática, funciona como uma “ferramenta” para o raciocínio lógico, o desempenho cognitivo, a comunicação de argumentos, bem como a produção argumentativa em textos científico-filosóficos.

Princípios matemáticos da lógica

Para compreender a natureza matemática da lógica é necessário conhecer e entender alguns princípios matemáticos, que estão relacionados tanto as competências quanto as habilidades cognitivas, como a capacidade de abstração, relação, associação, combinação, ordenamento, cumprimento de regras, generalização e critérios de universalidade. Um bom desempenho cognitivo do raciocínio lógico-matemático, também é necessário para produzir com qualidade técnica textos científico-filosóficos. Por essas razões, os princípios matemáticos foram classificados em: abstração, ordem, relação, regras e generalização universal.

Abstração – de acordo com Whitehead (2006, p. 37), a “matemática é pensamento movendo-se no âmbito da completa abstração”. Acredita que quando se pensa em um número, logo surge uma tendência natural de relação quantitativa, que tem caráter universal e pode ser aplicada em situações distintas. Segundo Silveira (2012, p. 73) a matemática tem como “principais objetivos desenvolver o raciocínio lógico, a capacidade de abstrair, generalizar, projetar etc.”, portanto, um bom raciocínio lógico depende de habilidades cognitivas relacionadas à abstração e a relação.

Por meio da abstração é possível perceber e apreender informações, representar conceitos para dar sentido à mente humana, a fim de possibilitar o surgimento de ideias. Através da relação podem-se associar conceitos para formular juízos, que também são relacionados e refletidos para inferir raciocínios, que podem ser comunicados na forma de argumentos.

Segundo Piaget (apud Kamii, 1999, p. 17) há dois tipos de abstração: a empírica, que consiste em focalizar certa propriedade do objeto e ignorar as outras; e a abstração reflexiva que envolve a construção de relações entre os objetos. Por não ter existência na realidade externa, a abstração reflexiva é uma construção realizada pela mente, usada para representar conceitos.

O conhecimento lógico-matemático tem sua base na abstração reflexiva, cujos números e combinações de signos linguísticos são representações elaboradas a partir daquilo que se percebe da realidade, como coisas, objetos, formas, fatos, situações etc.

Para realizar uma investigação ou pesquisa é necessário abstrair conceitos e informações por meio da percepção sensorial (empírica) ou da abstração reflexiva. O desempenho da abstração reflexiva é resultante do processo de síntese e/ou dedução das relações qualitativas e/ou quantitativas que se elaboram a partir dos interesses, finalidades e objetivos de aplicação.

Abstração é a meta da escolarização. O professor quer que os alunos sejam capazes de aplicar a aprendizagem de sala de aula em novos contextos, inclusive aqueles fora da escola. O desafio é que a mente não se interessa por abstração, ela prefere o concreto. É por isso que, quando encontramos um princípio abstrato – uma lei da física como força = massa X aceleração – nós solicitamos um exemplo concreto para facilitar a compreensão (Willingham, 2011, p. 86).

De acordo com a análise de Willingham, o pensamento abstrato é um desafio para a mente dos estudantes, é mais fácil pensar a partir de um fato concreto do que representar abstrativamente um novo conceito. Haja vista que, representar um conceito novo sem equivalência concreta, demanda um esforço pessoal que nem sempre o estudante esta disposta a fazer. Por isso é importante praticar atividades que desenvolvam habilidades do raciocínio abstrato, como jogos lógico-abstratos de tabuleiro ou eletrônicos, exemplo: Xadrez, Fanorona, Tapatan, Traverse, Liberiano Queah, Ziz-zag e outros.

Relação – a ideia de relação (associação ou combinação) esta presente em todos os outros princípios matemáticos. Quando se pensa em um número, signos linguísticos ou símbolos, e o representa mentalmente, surge na mente um conceito abstrato de alguma coisa, e quando se relaciona conceitos é inferida uma proposição, a partir de relações conceituais. Apreender uma ideia ou conceito abstrato significa agregar novas representações mentais, que podem ser relacionadas e transformadas em informação e conhecimento. Para tanto, é preciso julgar a relação entre os conceitos, enunciando sua veracidade, falsidade ou possibilidade.

De acordo com Durval (2003, p. 22), “a compreensão matemática esta intimamente ligada ao fato de dispor de ao menos dois registros de representação diferentes”. Esse entendimento é extensivo ao processo de elaboração do raciocínio lógico, cujos argumentos lógicos dependem da relação conceitual e da relação proposicional.

A noção de relação esta presente no processo investigativo de pesquisa, bem como no processo de aprendizagem, cujos conhecimentos prévios são confrontados, associados, combinados e relacionados com novos conhecimentos.

Ordem – de acordo com Russell (2006, p. 42), “a ordem não está na classe dos elementos, mas sim numa relação entre os membros da classe, segundo a qual alguns aparecem primeiro e outros depois. O fato de uma dada classe poder ter muitas ordens resulta de poder haver muitas relações entre os membros de cada classe dada” A ordem não esta nos elementos matemáticos, mais na relação que se pode estabelecer entre os elementos de uma classe. A lógica-matemática é versada na aplicação de variáveis com procedimentos diversificados, o que contribui com possibilidades distintas e criativas de conhecimento.

A noção de ordem depende da relação que se estabelece entre determinados elementos, existem possibilidades distintas para relacionar e estabelecer ordem entre os elementos, isso não significa que uma seja correta e a outra incorreta, apenas são possibilidades diferentes, que por vezes contribuem com a criatividade e o desenvolvimento cognitivo.

De acordo com Chrysikou (2013, p. 21), “executar tarefas comuns em ordem não convencional também pode perturbar o processo habitual de pensamento, aumentando assim suas perspectivas criativas”. Diversificar hábitos de ordenamentos das coisas e criar novas possibilidades é imprescindível para desenvolver o desempenho cognitivo.

Regras e generalização universal – o filósofo Kant (1724-1804) considera que existe na natureza uma conexão de fenômenos segundo regras, e por analogia, afirma que o “entendimento deve ser considerado como a fonte e a faculdade de pensar regras em geral” (Kant, 1992, p. 29). Compreende que a lógica é uma ciência racional que abrange tanto a forma (entendimento) quanto a matéria (experiência).

O princípio da universalidade é fundamentado em leis, fórmulas ou regras matemáticas, ou seja, uma regra deve ter aplicabilidade universal, mudando apenas as variáveis, fatos ou situações. No que tange a lógica, os argumentos dedutivos procedem de princípios universais.

A noção de regras universais pressupõe, a priori, relações conceituais caracterizadas por elementos distintos, cuja coerência lógica necessita do estabelecimento de ordem, organização e planejamento. Essa perspectiva das regras universais forma a base de fundamento teórico da lógica-matemática. Para Whitehead (2006, p. 43), “o exercício do raciocínio lógico sempre diz respeito a essas condições absolutamente gerais”, considera que o descobrimento de todas as condições abstratas, que são aplicáveis as relações entre os elementos concretos, são correlacionados entre si formando um modelo de relações imposta pela necessidade geral.

Esses princípios matemáticos da lógica estão relacionados a habilidades e capacidades da estrutura cognitiva, em especial o raciocínio abstrato e lógico. Assim compreende-se porque a primeira fase de desenvolvimento do raciocínio lógico esta relacionada à cognição.

O estudo e aplicação da lógica, como ferramenta para o processo investigativo, abrangem duas fases de desenvolvimento: a cognição, que são os instrumentos lógicos do pensamento e fazem parte dos processos mentais do entendimento e raciocínio; e a linguagem, que consiste na materialização do pensamento lógico através do uso de signos linguísticos e símbolos matemáticos, que objetivam comunicar ideias, juízos e raciocínios provindos da experiência pessoal, convivência social e percepção de mundo. Essas fases de desenvolvimento lógico se complementam durante o processo de raciocínio e construção de argumentos.

Cognição e raciocínio lógico

Segundo Maturana (2001, p. 126-127), a palavra cognição está relacionada ao domínio do conhecer, das relações interpessoais e das coordenações de ações. Afirma que “há tantos domínios cognitivos quantos forem os domínios de ações -distinções, operações, comportamentos, pensamentos ou reflexões”. No que tange a lógica, a cognição esta relacionada ao domínio do conhecer, da inteligência e do pensamento. A cognição é o processo de surgimento do significado das coisas, ou seja, à medida que os humanos se relacionam com o mundo, estabelecem significados para representar à realidade percebida, abstraída, refletida ou sintetizada.

A lógica de Aristóteles, apresentada nos livros que compõe o Órganon (2010), principalmente Categorias, Da Interpretação e Primeiros Analíticos, faz referência à relação entre conceito (ideias e formas), juízo e raciocínio. Explica que o humano é capaz de raciocinar a partir dos juízos que elabora por meio da experiência, a qual é resultante do conhecimento provindo do entendimento, que são formas ou ideias, denominadas conceitos.

De acordo com Maritain (2001, p. 17), o raciocínio funciona através da inteligência, quando ver e aprende alguma coisa, tais como informação, ideias, teorias e a própria experiência. Os instrumentos lógicos do pensamento, responsáveis pelo processo operacional de aquisição de conhecimentos, ocorrem ordenadamente em quatro etapas cognitivas: a simples apreensão, o conceito, o juízo e o raciocínio.

Simples apreensão - é “o ato pelo qual a inteligência atinge ou percebe alguma coisa sem dela nada afirmar ou negar” (Maritain, 2001, p. 35), ou seja, a apreensão é um ato primário do princípio da inteligibilidade, caracterizado como uma fase de transição entre o desconhecido e o conhecido e será ultrapassado quando conseguir formular um conceito coerente e claro daquilo que busca conhecer.

Conceito - Aristóteles (2010, pp. 39-41) considera o conceito uma representação mental das coisas existentes, são nomes com significado, compreensão e extensão de aplicabilidade. Ocorre no nível da completa abstração. Para Maritain (2001, p. 41), consiste naquilo que a razão, por meio da inteligência, “produz ou exprime em si mesmo, em que ele atinge ou apreende uma coisa”. E para Kant (1992, pp. 109-110), o conceito é “uma representação universal ou uma representação daquilo que é comum a diversos objetos”, considera que se origina no entendimento e se processa por reflexão e abstração, produzindo ideias na mente ou pensamento, também afirma que “a ideia é um conceito da razão, cujo objeto não se pode de modo algum encontrar na experiência”, esclarece que os conceitos são ideias intermediarias para se chegar a um raciocínio. Portanto, a compreensão de um conceito na mente ou pensamento representa a superação da fase da apreensão, pois aprender um conceito é ter uma ideia representativa daquilo que se almeja conhecer.

Juízo – “é o ato pelo qual o espírito compõe ao afirmar ou divide ao negar”, o juízo é elaborado mentalmente, “quando o intelecto compara um conceito com outro, como apreendendo a conjunção ou a identidade das coisas de que são as concepções, e divisão quando compara um conceito com outro de modo a apreender que as coisas são diversas” (Maritain, 2001, pp. 109-110). Isso significa que um juízo é formulado por meio de uma relação conceitual, que pode ser afirmativa ou negativa: quando os conceitos dão ideia de união ocorre uma afirmação; e quando os conceitos dão ideia de separação ocorre uma negação. De acordo com Kant (1992, p. 121), “um juízo é a representação da unidade da consciência de diferentes representações, ou a representação da relação das mesmas, na medida em que constituam um conceito”. Portanto, um juízo é uma representação mental, afirmativa ou negativa, da relação conceitual (unidade de consciência), e só pode ser pensado quando há compreensão e conhecimento do sentido e significado dos conceitos; é preciso apreender os conceitos para poder elaborar juízos coerentes a respeito das suas possibilidades e contingências relacionais.

Raciocínio – consiste no ato pelo qual a inteligência progride no conhecimento através de um movimento progressivo que vai do conhecido ao desconhecido, adquirindo algo novo por meio do descobrimento ou da invenção, com o intuito de estabelecer ou demonstrar possíveis verdades. De acordo com Maritain (2001, p. 173), “raciocinar é passar de uma coisa intelectualmente apreendida a outra intelectualmente aprendida graças à primeira”, afirma que raciocinar é progredir de um juízo para outro a fim de conhecer verdades inteligíveis. No ato de raciocinar, o intelecto é movido por dois ou mais juízos (antecedentes), para produzir um juízo conclusivo (consequente) caracterizado como síntese. Esse processo de deduzir um juízo consequente a partir de juízos antecedentes dar-se-á por meio da inferência. Para Kant (1992, p. 135), “por inferir deve-se entender a função do pensamento pela qual um juízo é derivado de outro. Uma inferência em geral é, pois, a derivação de um juízo a partir de outro”, portanto, o raciocínio depende da capacidade dedutiva de inferir de juízos antecedentes um juízo consequente, possibilitando a aprendizagem de novos conhecimentos na estrutura cognitiva.

Essas etapas cognitivas do raciocínio lógico, com exceção da simples apreensão, podem ser materializadas e comunicadas através da linguagem, com o proposito de transmitir a outrem aquilo que foi elaborado ou produzido racionalmente.

Linguagem lógica argumentativa e proposicional

Para a lógica, o principal uso e função da linguagem é a transmissão de informação. Não basta elaborar mentalmente um raciocínio lógico, é precisa saber transpor a cognição lógica em linguagem formal ou informal, observando as seguintes relações: o conceito pode ser expresso em um termo; o juízo pode ser enunciado em uma proposição; e o raciocínio pode ser comunicado em um argumento.

O conceito são ideias que pode ser expressa através de um termo ou combinação de signos com sentido significável em uma linguagem. O juízo, que é uma relação conceitual, pode ser enunciado através de proposição, cuja estrutura básica é a relação entre os termos mediados por um verbo ou cópula, pois, de acordo com Aristóteles (2010, p. 85), “todas as proposições requerem a presença de um verbo ou da flexão verbal”. O raciocínio é uma relação proposicional deduzida por inferência, e é comunicado através de argumento (veja a figura 1).

Para construir um argumento é preciso saber escrever em linguagem lógica, que pode ser: formal (dedutiva) ou informal (dissertativo-argumentativa). Comumente um texto científico-filosófico utiliza linguagem lógica informal, mas dependendo do autor, o texto pode apresentar bons argumentos lógicos com sentenças proposicionais formais. O mais importante é saber combinar os conceitos e as proposições de modo a tornar o mais coerente possível os argumentos e teorias transmitidas em um texto científico-filosófico.



Estrutura do raciocínio lógico e da linguagem formal
Figura 1
Estrutura do raciocínio lógico e da linguagem formal
Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Lógica formal é o estudo das formas de argumento, modelos abstratos comuns a muitos argumentos distintos [...] Lógica informal é o estudo de argumentos particulares em linguagem natural e do contexto no qual eles ocorrem. Enquanto a Lógica formal realça generalidade e teoria, a lógica informal se concentra numa análise prática de argumentos. Os dois aproches não são opostos, mas um complementa o outro (Nolt; Rohatyn, 1991, pp. 33-34).

Assim como a lógica formal e informal se complementam, o mesmo ocorre com a linguagem lógica formal e informal, cujas estruturas proposicionais podem ser utilizadas tanto pela linguagem lógica formal, quanto informal.

A linguagem lógica formal segue uma estrutura lógica dedutiva ou canônica e é expressa em proposições-premissas e uma proposição-conclusiva, enquanto a linguagem lógica informal segue a estrutura de um texto dissertativo-argumentativo e é expresso em sentenças, cujas proposições do argumento estão diluídas com outras expressões complementares, que em lógico se denomina “ruídos” (MURCHO, 2003, pp. 13-14). Veja o exemplo no quadro abaixo:

Quadro 1
Diferença de argumento em linguagem lógica informal e formal

Diferença de argumento em linguagem lógica informal e formal
Fonte: Elaborado pela pesquisadora

De acordo com Branquinho, Murcho e Gomes (2006, p. 442), a linguagem simbólica proposicional são “linguagens artificiais constituídas pelos lógicos com o objetivo, científico, de estudar conceitos lógicos fundamentais”. Por causa da sua natureza matemática, a lógica simbólica proposicional enuncia suas proposições apenas em linguagem lógica formal, enquanto que a lógica argumentativa enuncia suas proposições tanto em linguagem lógica formal quanto informal.

Até os anos de 1940, a construção de uma linguagem formal era predominantemente identificada com a elaboração da sua sintaxe lógica. ‘Linguagem formal’ era, assim, sinônimo de ‘sistema sintático não-interpretado’. Hoje, considera-se que a interpretação de uma linguagem formal, isto é, o estabelecimento da semântica lógica para essa linguagem, pode ser parte integrante da sua construção, [...] uma linguagem formal pode ser completamente definida sem nenhuma referência a uma interpretação (Branquinho; Murcho; Gomes, 2006, p. 442).

Tradicionalmente, a linguagem formal era caracterizada pela não interpretação. Esse tipo de linguagem valoriza a objetividade do texto, limitando-se a informar apenas aquilo que esta explicitamente sendo comunicado ou enunciado. Atualmente a linguagem formal é compreendida como semântica lógica, que promove interpretações idealizadas, baseadas em conjunto de símbolos e regras de formatação.

Do ponto de vista do leitor ou interprete, a perspectiva da metalinguagem e da hermenêutica é muito importante para a compreensão textual; entretanto, do ponto de vista do autor ou produtor textual a semântica lógica é indispensável para a produção científico-filosófica. Apesar de a tradição semântica lógica desvalorizar o conteúdo implícito, restringindo-se a sentenças lógicas de natureza matemática, considera-se que é plausível a utilização das estruturas da lógica proposicional para tornar um texto científico-filosófico mais coerente e objetivo ao leitor, pois as estruturas proposicionais independem da interpretação, entendimento e compreensão textual.

Acredita-se que as características fundamentais da linguagem lógica formal é a mesma que um bom texto científico-filosófico almeja em sua construção, como clareza, certeza, objetividade, validade, verdade, coerência, correção, consequência, consistência e outros atributos semelhantes.

Todavia, para produzir a contento um bom texto científico-filosófico não basta apenas saber processar cognitivamente um raciocínio lógico e transpor em linguagem lógica formal, também é necessário que haja conhecimentos prévios para compor os argumentos.

De acordo com Aristóteles (2010, pp. 251-252), “toda a instrução intelectual procedem de conhecimento pré-existente [...] tanto as ciências matemáticas quanto qualquer outra arte é adquirida dessa forma. O mesmo ocorre com os argumentos lógicos”, que são constituídos de conhecimentos prévios, “por vezes é necessário para supor antecipadamente um fato, por vezes é preciso que compreendamos o significado do termo, e, por vezes, ambos são necessários”.

Portanto, os conhecimentos prévios são indispensáveis para o processamento do raciocínio lógico, pois a construção de argumentos depende dos conteúdos ou informações disponíveis na estrutura cognitiva, principalmente na memória. À medida que as informações são compreendidas, sintetizadas e relacionadas, o pensamento tona-se mais apto a organizar ideias, formular raciocínio lógico e comunicar bons argumentos em linguagem lógica.

A estrutura lógica argumentativa e proposicional na construção de textos científico-filosóficos

O estudo da lógica indica que existem vários tipos de argumentos, como indutivos, dedutivos, silogísticos, hipotéticos, analógicos, retóricos e dialéticos, mas para a lógica proposicional interessa apenas os argumentos dedutivos, que são demonstrativos por causa da sua natureza matemática. E para a lógica argumentativa, seu principal interesse são os argumentos dedutivos ou demonstrativos, que Aristóteles (2010, p.253) denomina de silogismo, afirma que o silogismo é um argumento demonstrativo e científico pelo “qual compreendemos alguma coisa pelo mero fato de apreendê-la”.

A análise a seguir, se baseia somente na estrutura proposicional dos argumentos dedutivos em linguagem informal, que são apropriados para comunicar raciocínios em textos dissertativo-argumentativos. Nesses argumentos, as proposições “encerram verdade ou falsidade em si mesma” (Aristóteles, 2010, p. 84), ou seja, as proposições são afirmações ou negações que encerram seu valor-verdade na própria relação conceitual. Em um argumento dedutivo, as proposições se classificam em: proposições-premissas (antecedente ou premissas); e proposição-conclusiva (consequente ou conclusão). Pode haver duas ou mais premissas em um argumento, mas sempre haverá somente uma conclusão. As proposições-premissas são consideradas provas evidentes da verdade de um raciocínio, pois a estrutura lógica das premissas, “servem para provar ou, pelo menos, fornecer alguma evidência para a conclusão” (Nolt; Rohatyn, 1991, p. 01).

Aprender a estrutura lógica proposicional de um argumento pode ajudar os estudantes tanto a reconhecer os argumentos em um texto científico-filosófico –que são as ideias norteadoras do texto–, quanto saber produzir argumentos lógicos em textos científico-filosóficos.

Segundo Gadamer (2012), em sua perspectiva hermenêutica da interpretação e compreensão textual, não é possível apreender a totalidade das concepções e ideias de um texto, mas é possível apreender as concepções gerais ou argumentos universais apresentados pelo autor. Partindo dessa perspectiva, é relevante que um estudante-pesquisador saiba ler, interpretar, entender, compreender e reconhecer os argumentos norteadores do texto pesquisado, afinal, o que mais importa em um texto científico-filosófico são os argumentos.

Para reconhecer os argumentos em um texto científico-filosófico é necessário saber diferenciar sentença e proposição. De acordo com Aristóteles (2010, p. 84), “sentença é fala dotada de significação, sendo que esta ou aquela parte pode ter um significado particular de alguma coisa, ou seja, que é enunciado, mas não expressa uma afirmação ou uma negação, [...], nem todas as sentenças podem ser classificadas como proposições”. Portanto, todo enunciado são sentenças, mas o conteúdo das sentenças nem sempre são proposições, e como os argumentos são constituídos de proposições pode-se dizer que: todo argumento é uma sentença, mas nem toda sentença é um argumento.

Somente as sentenças declarativas ou demonstrativas formam argumentos lógicos. Há outros tipos de sentenças que comunicam informações não-argumentativas, que visam apenas explicar, descrever, interrogar, ordenar, exclamar, dar exemplos, expressar possibilidades e temporalidade. Essas sentenças não-argumentativas servem para complementar as informações, interligar as proposições e dar sentido ao conteúdo dissertativo-argumentativo textual.

Para Copi (1981, p. 23), o “argumento é qualquer grupo de proposição tal que se afirme ser uma delas derivadas das outras, as quais são consideradas provas evidentes da verdade da primeira”. Pode-se dizer que o argumento é constituído de proposições (juízos), derivadas uma das outras com a intenção de fornecer as “provas” ou “razões” que justifiquem a conclusão. Segundo Weston (1996, p. 5):

«Argumentar» quer dizer oferecer um conjunto de razões a favor de uma conclusão ou oferecer dados favoráveis a uma conclusão [...] argumentar não é apenas a afirmação de determinado ponto de vista nem uma discussão. Os argumentos são tentativas de sustentar certos pontos de vista com razões. Neste sentido, os argumentos não são inúteis; na verdade, são essenciais. Os argumentos são essenciais, em primeiro lugar, porque constituem uma forma de tentarmos descobrir quais os melhores pontos de vista. Nem todos os pontos de vista são iguais. Algumas conclusões podem ser defendidas com boas razões e outras com razões menos boas. No entanto, não sabemos na maioria das vezes quais são as melhores conclusões. Precisamos, por isso, de apresentar argumentos para sustentar diferentes conclusões e, depois, avaliar tais argumentos para ver se são realmente bons. Neste sentido, um argumento é uma forma de investigação.

Se o objetivo dos argumentos é descobrir os melhores pontos de vista, então o argumento é uma forma de investigação. Weston (1996, p. 5) considera que os argumentos são essenciais por dois motivos: porque tentam descobrir as melhores razões para apoiar uma conclusão, e depois avaliar se as razões do argumento são realmente boas para justificar a conclusão; e porque quando chega a uma conclusão bem apoiada em suas provas oferece razões sólidas para influenciar a opinião de outrens, e assim convencê-los de suas ideias.

Para Weston (1996, pp. 5-6), apesar das regras da argumentação terem objetivos específicos, nem sempre são compreendidas e respeitadas por estudantes e pesquisadores. Comumente, quando se pedi a um estudante para argumentar a favor do seu ponto de vista acerca de um assunto ou problemática qualquer, “escrevem afirmações intrincadas, mas não oferecem verdadeiramente razões que levem a pensar que os seus pontos de vista são corretos. Escrevem um ensaio, mas não escrevem um ensaio argumentativo”.

Considerando as explicações de Copi e Weston, as regras da argumentação objetivam provar a verdade de um raciocínio de forma clara, coesa e persuasiva. Para ilustrar a relação entre sentença e argumento, veja o exemplo no quadro 2, que diferencia uma sentença explicativa de uma sentença argumentativa.

Quadro 2
Sentença argumentativa e não-argumentativa

Sentença argumentativa e não-argumentativa
Fonte: Elaborado pela pesquisadora

De modo geral, as proposições dos argumentos dedutivos são classificadas em proposições simples ou categóricas e proposições compostas ou hipotéticas. Considera-se plausível a utilização da estrutura proposicional dos argumentos dedutivos –sejam simples, compostas ou complexas–, como modelos para construir argumentos científico-filosóficos.

As proposições simples ou categóricas fazem parte do estudo da lógica clássica aristotélica, sua estrutura básica é formada por: um quantificador universal ou particular, com qualidade afirmativa ou negativa; dois termos ou classe, sendo um o termo sujeito e o outro o termo predicado; e uma cópula verbal que faz a mediação entre os termos sujeito e predicado. De acordo com Copi (1981, p. 143), toda proposição categórica tem qualidade (afirmativa ou negativa) e quantidade (universal ou particular), que serve para definir a inclusão, completa ou parcial da classe (ou termo). Exemplo: “todo juiz é honesto”(1) não significa que “todo honesto é juiz”(2), no exemplo (1), a classe “juiz” está incluída completamente na classe “honesto”, mas a classe “honesto” não esta incluída na classe “juiz”, portanto, não se pode mudar simplesmente a posição dos termos e atribuir o mesmo significado.

As proposições compostas ou hipotéticas fazem parte do estudo da lógica moderna, constituídas principalmente a partir da lógica simbólica proposicional. Os fundamentos basilares das proposições compostas foram apresentados inicialmente na obra Tratados Lógico-filosóficos, pelo filósofo e matemático Wittgenstein (1995), que propôs o cálculo do valor lógico das proposições elementares ou simples, a partir do método das tabelas de verdade. As proposições compostas são formadas pela união de duas proposições elementares ou simples, e as proposições complexas são formadas pela inserção de uma proposição composta dentro de outra. A classificação básica das proposições compostas é: conjunção, disjunção, condicional, bicondicional e negação, que respectivamente, são demonstradas através do uso dos conectivos: “e”, “ou”, “se...então”, “se...somente se”, “não” (Copi, 1981, pp. 226-234). O quadro 3 ilustra a classificação das proposições simples e compostas.

Quadro 3
Estrutura formativa das proposições simples e compostas

Estrutura formativa das proposições simples e compostas
Fonte: Síntese e exemplos da pesquisa.

Nesta pesquisa, considera-se que o mais importante não é o valor lógico das proposições nos argumentos, mas sim a estrutura proposicional dos argumentos, que foram exemplificadas no quatro 3. São modelos de afirmações, negações, junção de ideias e condições lógicas que podem indicar como comunicar e expressar a síntese ou a dedução de um raciocínio, principalmente a proposição condicional, que pressupõe condições necessárias e suficientes para afirmar uma conclusão, exemplo: Se a potência é uma capacidade inata (ou a priori) do ser humano, então não deriva da experiência, portanto podemos haurir que nascemos com certa disposição potencial natural. Neste exemplo, a conclusão (nascemos com certa disposição potencial natural) é derivada a partir da afirmação e negação da proposição condicional (a potência é uma capacidade inata; a potência não deriva da experiência).

Weston (1996, p. 7) explica que “o primeiro passo para redigirmos um argumento é perguntarmos: que desejamos provar? Qual a conclusão?” Utilizando a forma estrutural das proposições simples e compostas, pode-se afirmar com clareza e objetividade as razões que provam uma conclusão em um argumento.

Para Severino (2007, p. 78), todo texto científico-filosófico é dissertativo-argumentativo, e seu “objetivo é demonstrar, mediante argumentos, uma tese, que é uma solução proposta para um problema, relativo a determinado tema”. Também afirma que a “demonstração baseia-se num processo de reflexão por argumentação, ou seja, baseia-se na articulação de ideias [conceito] e fatos, portadores de razões que comprovem aquilo que se quer demonstrar”. Dessa maneira compreende-se que a demonstração é um processo sequenciado de argumentos lógicos.

Dissertação é a forma geral do discurso e quer dizer que o discurso está pretendendo demonstrar uma tese mediante argumentos; demonstração é, pois, o conjunto sequenciado de operações lógicas que de conclusão em conclusão chega a uma conclusão final procurada; argumentação é entendida como uma operação, uma atividade executada durante a demonstração pelo uso dos argumentos; já raciocínio é um processo lógico de conhecimento, operação mental específica que pode servir inclusive de argumento para a demonstração (Severino, 2007, p. 80).

Para que um texto dissertativo-argumentativo seja compreensível é preciso que tenha sentido lógico, e uma das formas possível de comunicar um texto com sentido lógico é apresentar suas concepções, ideias ou teorias em linguagem argumentativa com estruturas proposicionais lógicas.

Não basta apenas dizer a um estudante-pesquisador que sua produção deve ser escrita de forma lógica e coerente, é necessário ensinar as estruturas de composição das proposições e argumentos lógicos, bem como exercitar com os estudantes a identificação de argumentos lógicos em textos científico-filosóficos, e desenvolver o desempenho cognitivo de síntese e dedução de juízos e raciocínio, bem como saber produzir e comunicar textos científico-filosóficos em linguagem lógica argumentativa (formal e informal). Segundo Copi (1981, p. 26), em um texto demonstrativo pode “conter dois ou mais argumentos, quer em sucessão, quer interligados”, por vezes, a conclusão de um argumento se torna premissa para outro argumento, e gradativamente vai surgindo um texto dissertativo-argumentativo com encadeamento de ideias e ordenamento lógico.

Em suma, a intenção desta pesquisa não é defender a aplicabilidade da lógica formal tradicional na produção de textos dissertativo-argumentativos, mas sim a utilização das estruturas proposicionais e argumentavas na construção de textos científico-filosóficos ou dissertativo-argumentativos, com o propósito de demonstrar aos estudantes-pesquisadores como elaborar e comunicar um raciocínio lógico.

Considerações finais

Acredita-se que o principal cerne valorativo do instrumento da lógica é a composição de argumentos baseados em estruturas proposições apropriadas para comunicar sentenças com clareza, coesão, objetividade e correção, visando sobretudo a compreensibilidade do leitor.

A leitura é fundamental para uma boa produção textual, no entanto, para produzir um texto científico-filosófico, com ideias, teses e teóricas, é necessário saber comunicar de modo lógico argumentativo, o que se aprende a partir da prática de identificação e construção de argumentos lógicos.

Considera-se que o objetivo inicial desta pesquisa foi atingido a contento, haja vista que a análise epistemológica da relação entre a lógica argumentativa e a lógica proposicional, indicou as perspectivas comuns entre essas duas áreas de estudo da lógica, como seus fundamentos matemáticos, processo cognitivo do raciocínio lógico e sua transposição em linguagem formal e informal. A partir dessa análise inicial, foi deduzido e demonstrado como podemos utilizar a estrutura proposicional e argumentativa na construção de textos científico-filosóficos.

Em suma, a base de construção de argumentos lógicos, depende do desenvolvimento e do desempenho de habilidades cognitivas, como pensamento abstrato, reflexivo e crítico, bem como capacidade relacional de conceitos e ordenamento de ideias.

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Notas

1 Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), fundada em 1940, é um órgão sem fins-lucrativos que se destina a regulamentar as técnicas de produção feitas no país. A padronização das normas técnicas dos produtos científicos e tecnológicos documentais é fundamental para a compreensão e identificação dos mesmos.

2 O Estoicismo era uma escola filosófica do início do século III a.C., ensinavam sobre ética e lógica, prezavam a felicidade e desprezavam sentimentos e paixões.

Notas de autor

[1] Mestra em Educação em Ciência na Amazônia pela Universidade do Estado Amazonas (UEA). Especialista em Psicopedagogia e Graduada em Filosofia pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Membro do Núcleo de Pesquisa em Neurociência e Educação do Programa de Pós Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia. Professora de Lógica, Metodologia de Pesquisa e Filosofia Moderna da Faculdade Salesiana Dom Bosco (FSDB/Manaus-AM).

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